Paisagem IV

Na manhã reluzente,
na tarde esfacelada,
no trecho pendente
da vazia estrada.

Pinta um ponto.
Soltando a poeira.

Maria-fumaça.

Oração


A cada minuto, pinto mais palavras.
Minha tez febril, minhas mãos frias.
Enquanto, lentamente, tu lavras
a máscara de outro que tem dias.

Sufoco, como se dentro d'água,
e grito para teu olhar infinito.
Se não vês meu pranto e mágoa,
teu carinho se torna mito.

Se constrói em algumas horas.
É nessas que deposito a esperança,
seja verdade que meu sorriso adoras.
Como coração sem dor de lança.

Mas não sei, não vejo fulgor.
Se entendesse, seria mais viva,
abraçaria teu corpo em flor,
sem ser luxuriosa ou lasciva.

Não espero tua compreensão,
já que imploro como mendigo.
Atada em laços como prisão,
declamo para salvador amigo.

Pedaço


Enquanto eu puder rasgar as páginas do meu pequeno caderno preto.
Enquanto eu tiver cinco flores para secar no livro grosso.
Enquanto suportar a incrível exatidão de ser anestesia de mim mesma.
Posso pintar um quarto amarelo d'ouro com quatro cantos escuros com nódoas de sangue, e um tapete azulzinho e cheio de serragem, ou talvez ferrugem de tempos onde eu plantava um jardim no meu coração de menina.

República


Enquanto vão costurando a bandeira
Com dedos ágeis e tão hábeis que doem,
Um mastro largado contra o solo de terra
As estrelas manchadas de poeira

Um menino olha pela janela e vê:
Pedaços de idéias como membros do corpo.